Portugal tem sido, por tradição, um excelente campo germinador de guarda-redes.

Não têm sido muitos, é verdade, nem se têm tornado vedetas Mundiais, ao nível de Lev Yashin, Sepp Maier, Peter Schmeichel ou Oliver Kahn.

Mas tem tido grandes guarda-redes, jogadores que gostamos de ver jogar, em quem confiamos as redes da baliza do nosso clube. E tivemos grandes guarda-redes como Costa Pereira, José Henrique, o famoso Zé Gato, Manuel Bento ou Vítor Baía. Mas também houve, entre o final dos anos ’60 e os anos ’80, o sportinguista Vítor Damas, o guarda-redes do Sporting CP quando, ao mesmo tempo, no SL Benfica, estava Manuel Bento. Adversários e amigos. Mas Vítor Damas quase nunca conseguiu ultrapassar o guarda-redes do SL Benfica e, quando o conseguiu fazer, foi por lesão do primeiro. Mas nada disto tira a magia e a lenda em que se tornou, para o universo sportinguista e para Portugal, Vítor Damas, um grande entre os grandes. O jogador que mais vezes representou o Sporting CP.

Vítor Damas era grande. Faleceu cedo. E merece ser recordado.

O Nascimento de um Guarda-Redes

Vítor Damas era um alfacinha. Nasceu, e faleceu, em Lisboa. E viveu (quase) toda a sua vida em Lisboa.

Tinha acabado já há 2 anos a Segunda Guerra Mundial quando Vítor Damas abriu os olhos. Estávamos em 1947. Lisboa fervilhava e esta criança iria ser adepta do Sporting CP.

Por isso, foi de uma enorme alegria quando, aos 19 anos, Vítor Damas foi chamado para defender as redes do seu clube. É que esta era uma época de amor à camisola, em que o sonho de alguns jogadores era representar a equipa do coração. E Vítor Damas foi um desses jogadores, que ambicionavam representar a equipa do coração.

Mais tarde haveria de fazer algumas passagens pelo Santander, em Espanha, e de regresso a Portugal pelo Vitória de Guimarães e pelo Portimonense, antes de voltar, definitivamente, ao clube do seu coração, onde terminaria a carreira.

Vítor Damas no Sporting CP

O benfiquista José Henrique era chamado de Zé Gato, mas Vítor Damas era ágil, felino, elástico, destemido e muito elegante. E esta, a sua imagem de marca

Tudo começou, contudo, no Sporting CP, em 1966. Vítor Damas tinha 19 anos e foi como suplente para a equipa principal sportinguista, depois de ter feito o percurso pelas camadas jovens. Foi com esse estatuto, de suplente que acabaria por se estrear, que Vítor Damas fez o seu primeiro jogo e logo contra o FC Porto, jogo que terminou empatado a 2 golos. Mas durante 2 épocas trabalhou para o momento inevitável da conquista da baliza. E esse momento aconteceu em 1968. E em 1969 ganhou o Prémio Stromp de Melhor Atleta Profissional. Até 1976, as redes sportinguistas foram dele.

Durante esse tempo tornaram-se lendários os confrontos entre Damas e Eusébio. O melhor jogador português e um dos melhores guarda-redes portugueses. Um a querer marcar, outro a querer defender. E foi assim por muito tempo. Umas vezes um deles levava a melhor. Outras vezes levava o outro.

Vítor Damas era ágil, felino, elástico, destemido e muito elegante. Foi, provavelmente o melhor guarda-redes do Sporting CP.

Depois de tantos anos de brio e brilho sportinguista, após o 25 de Abril, e com a alteração de algumas regras e leis laborais, o FC Porto fez um ataque cerrado a vários jogadores sportinguistas, conseguindo levar Dinis e Alhinho. Vítor Damas também estava na lista mas, para que não fosse mais outro jogador do Sporting CP para os rivais do norte, o Presidente leonino, João Rocha, arranjou maneira que ele fosse para o Racing Santander, clube espanhol por onde Vítor Damas acabou por estar durante 4 épocas. Chegou a ser contactado pelo Atlético Madrid, mas o Santander não o quis vender.

4 anos passados, e acabado o contrato, Vítor Damas voltou a Portugal. Veio para o Vitória de Guimarães e, depois, Portimonense. No Algarve encontrou o técnico Manuel José, que o trouxe de volta para o Sporting CP, outra vez. Estávamos em 1984. Vítor Damas defendeu a baliza sportinguista até 1989, altura em que pendurou as luvas e se tornou treinador de guarda-redes, ainda no Sporting CP. Depois de uma pequena passagem pelo Lourinhanense, Vítor Damas retornaria ao seu Sporting para treinar as camadas mais jovens, trabalho que faria até ao fim dos seus dias.

A Selecção Nacional

Se por um lado, Vítor Damas é o celebrado guardião sportinguista, dono das redes da equipa de Alvalade, por outro acabou por ter azar com a época em que viveu.

Desde cedo chamado à Selecção Nacional, Vítor Damas intercalou a titularidade com José Henriques, o Zé Gato benfiquista. Ora jogas tu, ora jogo eu. Mas quando José Henrique perdeu a titularidade no SL Benfica para Manuel Bento, também a perdeu na Selecção e, a partir dessa altura, Manuel Bento passou a ser o guarda-redes titular também da Selecção Portuguesa e, Vítor Damas ficou-se pela situação de suplente.

Contudo, mesmo nessa situação, Vítor Damas estará presente no Europeu de 1984, em França, e no Mundial de 1986, no México.

Em França, Vítor Damas não saiu do Banco, que o Bento deu muito boa conta do recado. Foi o Europeu onde Portugal perdeu com a Selecção de França, nas meias-finais, por 3 a 2, já em prolongamento, com a equipa que iria ganhar o torneio.

Vítor Damas na Selecção Nacional

Vítor Damas, ao lado de Manuel Banto, de quem era suplente na Selecção Nacional, sob o olhar de Mário Wilson

Já no México, no meio da tanto azar e complicação, este foi o Mundial de Saltillo, Manuel Bento faz o primeiro jogo do Mundial, contra a Selecção de Inglaterra e ganha 1 a 0. Depois, durante um treino, lesiona-se e parte uma perna. E já não recupera. Manuel Bento encerra ali, de uma forma inglória, a sua tão rica carreira. E o azar de uns, é a sorte de outros. Pois, só que não é sempre assim.

Com a lesão de Bento, Vítor Damas ganha a titularidade na baliza portuguesa. A Selecção Nacional faz o segundo jogo do Mundial, contra a Polónia, e perde por 1 a 0. Mas o pior estava para vir. O terceiro, último e decisivo jogo é contra Marrocos. E Portugal volta a perder. 3 a 1 foi o resultado final. E a Selecção Nacional ficava afastada da fase seguinte, colocada em último lugar do grupo.

Depois deste Mundial, as coisas mudaram muito entre a Federação, os clubes e os jogadores. Quase todos os jogadores foram afastado. Houve uma renovação da equipa que começou a dar frutos nos anos ’90.

Vítor Damas, que acaba por estar ligado às duas derrotas no Campeonato do Mundo de 1986, no México, merecia ter tido outro final.

Mas o certo é que as gentes têm boa memória e para todos, Vítor Damas sempre foi maior do que esse Mundial. Foi, sem dúvida, o maior guarda-redes do Sporting CP, e um dos maiores de Portugal, que teve o azar de partilhar o tempo com Manuel Bento.

Fica, contudo, essa outra façanha: o jogador que mais vezes representou o Sporting Clube Portugal.

Boas Apostas!