Suprema ironia do destino, que tenha sido uma escorregadela do capitão Steven Gerrard a abrir a porta para a vitória do Chelsea em Anfield Road, desaire esse que pode muito bem custar o tão aguardado título ao Liverpool. Acontece aos melhores e Gerrard é, sem dúvida, um deles. Líder que dispensa protagonismos, jogador incansável, um membro distinto do cada vez mais exclusivo clube de jogadores de uma só camisola.

O que importa

Steven George Gerrard entrou na Academia do Liverpool aos nove anos e foi um amor para a vida. Da formação à equipa principal, e mais tarde à braçadeira de capitão, foi um percurso natural para quem além das qualidades futebolísticas sempre evidenciou capacidade de liderança.

Se Gerrard tivesse saído do seu clube do coração, aceitando as propostas que foram surgindo e sendo reiteradas, provavelmente teria uma vitrina cheia de troféus. É público que José Mourinho o tentou levar consigo, primeiro para o Chelsea, depois para o Real Madrid, utilizando o argumento de que no Liverpool ele não iria ganhar nada. Mas Steven sempre afirmou que as suas prioridades eram outras. Não o dinheiro, não as conquistas, que são claramente importantes, mas o sentir-se bem, em casa e acarinhado, fazer parte de uma família. E em Anfield ele encontrou tudo isso.

Renascer aos 33

Steven-Gerrard

A Taça dos Campeões Europeus é a sua maior vitória

Brendan Rodgers atribui-lhe um novo papel em campo – mais defensivo e de contenção – que provavelmente lhe permitirá jogar mais alguns anos ao mais alto nível. De ínício até se poderia pensar que tanto Gerrard como os adeptos iam sentir falta dos arranques para a frente, dessa liberdade de avançar que o médio tinha anteriormente. Mas ele encaixou tão bem nas suas novas funções, lançando o ataque desde a retaguarda, que as dúvidas logo se dissiparam. No fundo, Gerrard descobriu uma nova forma, mais adequada à sua experiência, idade e condição física de ser essencial à dinâmica dos Reds.

Os números não mentem e, segundo Rebecca Parry, sob a orientação do novo técnico, Steven foi titular em sessenta e sete partidas, sendo responsável por dezanove assistências e vinte e dois golos, contra os sessenta jogos, catorze passes para golo e dezoito tentos das três temporadas anteriores reunidas. Esta época, o capitão do Liverpool ganhou 72% das cento e noventa e sete disputas de bola em que esteve envolvido, uma boa forma de medir o esforço e empenho que dedica a cada desafio. No Domingo, por exemplo, negou ao Chelsea sete situações de golo. Mas a sua ação não se fica pelo trabalho defensivo. Claro que Suárez, Coutinho e Sterling dominam as estatísticas ofensivas da equipa. Mas Gerrard é líder incontestado nos cantos e cruzamentos. Só em 2013/14, o médio fez cento e cinquenta e sete cruzamentos para a área adversária. E oito das dez assistências que têm nesta temporada resultaram da marcação de lances de bola parada.

O título que falta

Ao nível de clubes, Gerrard já ganhou tudo o que havia para ganhar. A Liga dos Campeões, a Taça UEFA, a Supertaça Europeia e todas as taças de Inglaterra. Só lhe falta um troféu, aquele que escapa ao Liverpool há vinte e quatro anos. O próprio capitão, dos Reds e da Seleção Inglesa, admitiu que houve momentos de grande desânimo, nestes dezasseis épocas que leva em Anfield, em que desistiu do sonho de conquistar a Liga Inglesa. Para um emblema com a história do Liverpool é muito duro aguentar um período tão prolongado sem essa glória. Mas quando Brendan Rodgers trouxe consigo outra confiança. “Gostei da visão que tinha para o clube. Acreditei plenamente na direção e planos que tinha. Agarrei-me a essa centelha de esperança, de que ainda teria uma chance, uma derradeira oportunidade antes de pendurar as botas. E cá está ela.”

Brendan Rodgers e Luis Suárez não poupam elogios, ao futebolista e ao homem. Até os adversários, como Frank Lampard, se juntam ao coro de louvores. As opiniões são consensuais: Gerrard é um futebolista de eleição e um exemplo a seguir, que já merecia o troféu que há tanto lhe escapa.

Boas Apostas!