Por vezes a História tende a reduzir a datas muito concretas, momentos, factos, acontecimentos que tiveram lugar ao longo do tempo, que não nasceram nem começaram exactamente numa data, mas foram sendo criados, e não terminaram numa data concreta, mas foram morrendo, sendo terminados.

Mas há, também, as datas que marcam. Há as que marcam de forma convencional, como o 25 de Dezembro, que se determinou como a data em que terá nascido Jesus Cristo, e as que marcam de forma efectiva, porque ocorreram, realmente, nessa data concreta, por exemplo o 25 de Abril, o dia em que uma revolução alterou o estado de coisas no país.

Assim, também na história recente do FC Porto, um dos maiores e mais importantes clubes nacionais de projecção mundial, houve um momento que marcou para sempre a transformação de uma equipa de bairro, noutra que se quis afirmar no país e na Europa. Tudo nasceu naquela ligação entre Jorge Nuno Pinto da Costa e José Maria Pedroto.

Depois desta dupla ter entrado pelo FC Porto dentro e questionar e derrotar o estado de poder instituído, este Porto nunca mais foi o mesmo, e o país passou a olhá-lo com outros olhos.

Depois de décadas o país desportivo estar dividido entre benfiquistas e sportinguistas, passou a haver uma terceira força que, em pouco tempo, passou a ombrear com o SL Benfica o estatuto de maior equipa de Portugal. Efectivamente, passou-o em termos de conquistas fora de portas. Não em adeptos.

Mas tudo começou lá muito para trás, nos anos ’70 do século passado.

Um Treinador para Lá da Moda

Pedroto Jogador

Como jogador, Pedroto começou nas camadas jovens do FC Porto, e depois de ter andado por muitos outros sítios, voltou ao FC Porto para ser Campeão Nacional

José Maria Pedroto nasceu para os lados de Lamego em 1928.

Desde cedo, o futebol atravessou-se no seu caminho. Começou nas camadas mais jovens do FC Porto, mas acabaria por sair, ainda júnior, para o Leixões. Mais tarde, devido ao Serviço Militar Obrigatório, e a sua deslocação para o sul do país, acabou por ir parar ao Lusitano de VRSA.

Pedroto não tinha grande corpo físico para o futebol pesado de então. Mas tinha talento. Bom no drible, no passe, na visão de jogo. Elegante no meio-campo.

Aos 22 anos, transfere-se para o Belenenses. Um ano mais tarde estreia-se na Selecção Nacional e, um ano depois, volta ao FC Porto do seu coração, tanto deu nas vistas no meio-campo da equipa da cruz de Cristo.

O FC Porto estava a construir uma grande equipa e Pedroto seria elemento essencial para essa grande equipa.

Em 1956, tinha José Maria Pedroto 28 anos, e sob o comando técnico de Dorival Yustrich, o FC Porto faz a dobradinha, conquistando o Campeonato e a Taça de Portugal.

Depois de anos brilhantes e cheios no FC Porto onde, inclusivamente chegou a ser treinado por Béla Guttman, o mesmo húngaro da maldição do SL Benfica, José Maria Pedroto entende que, aos 32 anos, está na hora de pendurar as chuteiras, e assim o faz. Mas não se afasta do futebol. Em 1960 torna-se o primeiro treinador português com curso superior.

Começa, como treinador, mais uma vez, nas camadas jovens do FC Porto, de onde transita para as, também, camadas jovens da Selecção Nacional.

Com o bom trabalho executado nas camadas jovens, Pedroto sente estar na hora de dar o salto para o campeonato dos grandes e abraça um projecto da Académica de Coimbra, com bons resultados alcançados. Quando sai é substituído por Mário Wilson com quem nunca teve boas relações, não se sabendo se vêm desta altura.

Depois da Académica de Coimbra, José Maria Pedroto passa ainda pelo Leixões da sua infância, mas onde neste seu regresso não foi feliz, tendo sido vítima de chicotada psicológica por falta de resultados. Para provar que a culpa não era sua, foi treinar o Varzim que se tornou, nesse ano, a equipa sensação da Primeira Divisão.

Em 1966, estava José Maria Pedroto com 38 anos, e depois dos bons trabalhos em Coimbra e na Póvoa, é convidado para treinar a equipa principal do seu coração, o FC Porto. Mas as coisas não correram lá pelo melhor: em 3 anos de trabalho no Porto, Pedroto limitou-se a conquistar uma Taça de Portugal. Pouca para quem era tão exigente. Isto tem levado a que algumas pessoas questionem a superlatividade de Pedroto como treinador, como o fez, na sua habitual crónica no jornal A Bola, Miguel Sousa Tavares, a propósito de alguns dizeres sobre o esquecimento do treinador nos prémios de comemoração dos 100 anos da Federação Portuguesa de Futebol.

Mas depois, vai para Setúbal e, mais tarde, volta de novo ao Porto, mas para treinar o Boavista. E se as coisas não funcionaram pelo melhor no FC Porto, em Setúbal, Pedroto consegue as melhores qualificações do Vitória, chegando, inclusivamente, a ficar em segundo lugar no Campeonato Nacional, e a fazer brilharetes na Europa, para além de chegar a finalista da Taça de Portugal. Quando, em 1974, chega ao Boavista, também faz história. Consegue um segundo lugar no Campeonato Nacional, e conquista duas Taças de Portugal.

Em 1976 regressa, outra vez, ao FC Porto.

Pedroto e Pinto da Costa

José Maria Pedroto & Jorge Nuno Pinto da Costa

Pedroto e Pinto da Costa, a base de um FC Porto moderno, a pensar o futuro e a Europa

José Maria Pedroto regressa ao FC Porto em 1976 e, nas duas épocas seguintes, conquista os campeonatos, em 1977/78 e 1978/79 e uma Taça de Portugal. Falha o terceiro campeonato seguido e, na sequência dessa falha e de um Verão quente e muito conturbado que opôs o treinador, o director do futebol e o Presidente do clube, e que levou alguns jogadores a tomarem posições políticas que terminaram com a saída de alguns dos nomes mais importantes do clube, como António Oliveira, para o Sporting CP e Fernando Gomes, para o Sporting Gijón, Pedroto deixa o FC Porto e vai treinar o Vitória de Guimarães.

Esteve dois anos em Guimarães. Conseguiu um 4º e um 5º lugares para o Vitória no tempo em que por lá esteve.

Entretanto, no Porto, e no seguimento do Verão Quente, e como consequêcia deste peíodo conturbado, Jorge Nuno Pinto da Costa lança-se à conquista da presidência do FC Porto, levando, como porta estandarte da estratégia, José Maria Pedroto como treinador da sua equipa.

Pinto da Costa ganha as eleições e chega a Presidente. Em 1982, José Maria Pedroto regressa, novamente, ao FC Porto. Mas desta vez as coisas são para ser diferentes. Desta vez a dupla lança-se na guerra. Guerra contra o sul. Contra o que chamavam, poder instituído dos grandes de Lisboa. Contra os mouros. Como representantes de uma região, uma cidade, que se queixa de ser sempre deixada para segundo plano. E é assim que Pinta da Costa e Pedroto começam por ganhar a cidade e a região e montam uma equipa aguerrida, pronta a morrer em campo.

São os tempos de guerrilha. O norte contra o sul. O norte trabalhador contra o sul despesista. O norte português contra o sul dos mouros. É o tempo de quererem ver Lisboa a arder. Tempo do nós contra eles.

Jorge Nuno Pinto da Costa & Artur Jorge

Pinto da Costa e Artur Jorge, o discípulo de Pedrot, que viria ganhar a Taça dos Campeões

O FC Porto construiria grandes equipas. Equipas agressivas. Equipas com raiva. Equipas formadas por jogadores que se identificavam com o clube, a cidade e a região. O FC Porto deixou de ser uma equipa de bairro e construiu as bases do seu futuro sob o domínio de um treinador moderno que olhava para a frente.

Pedroto ficaria no FC Porto até 1984, e só foi afastado pela doença que o corroeu e o levou em 1985.

Durante estas duas épocas em que esteve como treinador do FC Porto, a equipa conquistou uma Taça de Portugal e foi finalista da Taça das Taças. Mas criou as bases do futuro. Diz-se que foi Pedroto que tornou o FC Porto uma equipa grande, maior que o país. O certo é que, o seu sucessor como técnico na equipa do FC Porto, Artur Jorge, seu discípulo, viria a ganhar a Taça dos Campeões Europeus em 1987, tornando-se no primeiro treinador português a conseguir tal façanha e que, até hoje, só José Mourinho o voltou a conseguir.

Depois do desaparecimento de José Maria Pedroto, as bases que lançou levaram o FC Porto à dimensão maior. Claro que isto só foi possível graças ao presidente do clube, Jorge Nuno Pinto da Costa, de quem um dia também aqui se falará.

Boas Apostas!