Há muito que se diz que esta seleção croata tem tudo para ser tão boa ou melhor que a de 98. No papel isso era inegável. Há talento em todas as posições e jogadores muito experientes na alta-roda do futebol mundial. Mas na prática parecia sempre faltar regularidade. No Euro 2016 a Croácia impressionou desde o primeiro minuto mas foi a afirmação de força frente à bicampeã europeia que lhe deu o estatuto. Mesmo sem Modric esta equipa representa perigo a vários níveis mas os riscos que assume também podem ser aproveitados. À consideração de Fernando Santos.

A melhor Croácia de sempre?

Esta é a quinta presença da Croácia numa fase final de um Europeu de futebol e os resultados anteriores foram repartidos. Por duas vezes não passou da fase de grupos. Em 2004, em Portugal, ficou atrás de França e Inglaterra; em 2012 levou novamente com dois pesos pesados – Espanha e Itália – no mesmo grupo e não foi capaz de contrapor esse favoritismo. Noutras duas participações chegou até aos quartos de final. Em 96, na estreia, partilhou o grupo D com Portugal e foram os dois apurados para seguir em frente. A Croácia acabaria afastada pela Alemanha no jogo seguinte (2-1). Em 2008 apanhou um grupo complicado, de que faziam parte alemães, polacos e um dos anfitriões, os austríacos. Agarrou o primeiro lugar, só com vitórias, passando à partida seguinte, altura em que foi eliminada pela Turquia nos penáltis (1-1, 1-3 p.).

Também desta feita a superação da fase de grupos foi conseguida, com distinção. À parte aquele colapso de quinze minutos frente aos checos, com interferência externa, praticaram bom futebol e conseguiram manter uma surpreendente regularidade nas exibições. No papel, há muito que se diz que esta Croácia tem tudo para ser tão boa ou melhor que a de 98, que chegou ao terceiro lugar no Campeonato do Mundo. Talento e sofisticação táticas não lhe falta, isso é certo. Em todos os setores tem jogadores experientes nestas andanças da alta-roda do futebol mundial. Jogam em grandes clubes – Real Madrid, Barcelona, Juventus, Fiorentina, Inter de Milão, Mónaco – e cobrem as ligas mais competitivas. Estar no Europeu também já lhes é familiar. Srna faz a quarta participação; Modric e Rakitic a terceira, Mandzukic a segunda e por aí fora. Temia-se que Ante Cacic não tivesse unhas para tocar esta guitarra mas a liderança sem protagonismo parece estar a funcionar. Sem cinismo, as agressões externas dos adeptos em guerra com a estrutura federativa, podem ter contribuído para uma maior união do grupo. Psicologicamente essa ameaça pode ajudar à motivação extra.

Confiar na estratégia

Esta Croácia tem tudo para ser tão boa ou melhor que a de 98.

Esta Croácia tem tudo para ser tão boa ou melhor que a de 98.

A Croácia entrou no jogo com a Espanha com ideias muito claras. Forçar o erro na saída de bola e conter o meio campo. A primeira parte é a mais imediata. Nikola Kalinic e Ivan Rakitic disseram desde o primeiro instante a Piqué, Ramos e mesmo De Gea que lhes iam fazer a vida negra. Pressionar, dois ou três jogadores na ajuda, em espaços muito curtos, em cima do homem que tem a bola. Não lhes dar tempo para pensar, para levantar a cabeça e encontrar uma linha de passe. O difícil nisto é manter a intensidade e a concentração. É assustador pensar como esta mesma abordagem pode afetar os dois centrais e a saída de bola de Portugal.

Gerir o tabuleiro

No meio-campo, embora o princípio fosse o mesmo a concretização era ligeiramente diferente. A Croácia permitia que os espanhóis circulassem a bola, mas entre eles, impedindo as tentativas de penetração. Deixavam-nos mastigar o jogo no miolo mas impediam-nos dar o próximo passo. A influência de Iniesta e Fabregàs diminuiu consideravelmente. David Silva foi o mais liberto e logo o mais esclarecido a encontrar as brechas, pelo menos até os croatas reajustarem as marcações. Mantiveram La Roja a uma distância segura da baliza de Subasic. Claro que estas ações tinham riscos. Mas nem o golo precoce de Morata, na sequência de um lance em que Busquets encontrou Fabregàs com espaço entre linhas, os fez vacilar da estratégia definida.

A terceira componente era a exploração das alas. De certa forma, a Croácia entregou Rakitic e Kalinic em sacrifício nas zonas interiores para ganhar as laterais. Perisic agarrou com ambas as mãos as ausências para assumir o protagonismo. Tanto lhe dá cruzar com o pé direito ou com o esquerdo, tanto lhe dá marcar ou dar a marcar.

A Croácia vem embalada e confiante mas também sabemos que a estabilidade que apresenta não lhe é natural. Estão na iminência de fazer algo especial e têm toda a gente entusiasmada. Isso pode pesar, essa responsabilidade pode mexer com o lado emocional.

Boas Apostas!